O Sport está de volta à elite. Depois de duas temporadas na segunda divisão do Brasileirão, a equipe pernambucana conseguiu, no último domingo (24), o acesso à Série A. O retorno é a “cereja do bolo” para Yuri Romão, presidente do clube, que se aproxima do fim do mandato e não pensa em reeleição. O pleito que definirá o mandatário do próximo biênio (2025/26) está marcado para o dia 16 de dezembro.

Estar à frente de um time de massa é “uma tarefa árdua, desgastante”, justifica. Em entrevista à ESPN, Romão analisou a gestão e projetou o futuro. O dirigente explicou a decisão de pagar R$ 500 mil ao Santos para ter Lucas Lima em campo no jogo que garantiu o acesso, falou sobre a reforma da Ilha do Retiro e se mostrou convicto: nenhum clube do Nordeste vai sobreviver sem SAF.

“Meu sentimento é de dever cumprido. Todas as energias eram canalizadas para o êxito da gestão. Já vínhamos em um processo de reestruturação, que passou por momentos difíceis. Esse acesso foi a cereja do bolo. O Sport é um clube grande, de torcida imensa, com patrimônio físico muito grande. Não poderia estar fora da Série A”, analisou.

Por que não vai tentar a reeleição?

Romão assumiu o Sport no fim de 2021, quando o clube estava prestes a ser rebaixado, por conta do pedido de licença – e depois renúncia – de Leonardo Lopes. No fim de 2022, foi eleito de forma efetiva. Ele poderia se candidatar à reeleição, mas prefere que outra pessoa seja candidata.

“Há uma necessidade de renovação, oxigenação. Estar sentado na cadeira de presidente de um clube de massa, com torcida forte como o Sport, não é fácil. É uma tarefa árdua, que desgasta muito. O momento é de dar espaço para outros companheiros até melhores do que eu. De forma humilde, tem gente melhor do que eu para comandar o clube”, explicou a decisão.

“Até a eleição acho que teremos um candidato forte. Espero que possamos ter alguém que incorpore o projeto, que é o projeto de transformar o clube em um clube forte, sustentável, que tenha protagonismo dentro da região Nordeste e que possa fazer frente às forças do futebol brasileiro que estão no eixo Sul e Sudeste. Isso que temos de valorar no próximo candidato. A ideia é que eu não seja o candidato”, seguiu.

“Conversei internamente, com minha família, é muito desgastante, a torcida cobra muito. Eu tenho uma característica que é que não sei fazer nada pela metade. Ou sou presidente de fato para fazer as coisas acontecerem ou prefiro… É preferível que outra pessoa possa estar à frente e eu ajudando. Tem pautas estratégicas que o Sport precisa destravar, como uma SAF, a reforma da Ilha do Retiro, a construção de alguns equipamentos dentro do complexo da Ilha do Retiro para rentabilizar a associação. Estamos dentro disso há algum tempo, com muito esmero, responsabilidade, critério. Eu preferiria estar mais ao largo da gestão, da microgestão do dia a dia, que é desgastante demais, para tomar conta mais das pautas estratégicas”, finalizou.

SAF é o futuro

O Sport aprovou, no último mês, uma reforma do estatuto. A partir de 2025, o clube pode negociar a transformação para uma Sociedade Anônima de Futebol, a famosa SAF. O atual presidente, Yuri Romão, acredita que esse é o caminho não apenas para o time rubro-negro, mas para o futebol nordestino de forma geral.

“Eu tenho uma convicção. Na vida toda eu sempre tive muita convicção. Tenho convicção hoje, dentro do ambiente do futebol brasileiro, que está mudando, mudando rápido e para melhor: a indústria do futebol tem crescido muito, se profissionalizado. Não há mais espaço para romantismo. Existe profissionalismo, planejamento estratégico bem elaborado para que um clube saia da mesmice. É preciso que se profissionalize”, iniciou.

“Entendo que há uma necessidade, principalmente para os clubes do Nordeste, onde a renda é bem menor do que os clubes do Sul e Sudeste, há necessidade de ter um parceiro financeiro ao lado. E esse parceiro, para estar ao lado, se faz necessário ter um instrumento que possa dar a segurança ao investidor. Ou seja, é a SAF. É a segurança jurídica que os investidores precisam para alocar os recursos em um clube”, continuou.

“Eu vejo com muita clareza que nenhum clube do Nordeste conseguirá sobreviver dentro desse novo ambiente do futebol brasileiro sem ter um parceiro financeiro do lado, por meio de um instrumento jurídico que é a SAF. Essa é minha convicção. Tem que ter uma SAF ao lado. Mas cada clube, com suas circunstâncias e ambiente, vai criar seu modelo de SAF. Essa é a diferença que vai ter, em relação a Sport e Bahia, diante de Fortaleza, Ceará, CRB… Todos os clubes têm seus modelos. O Sport precisa ter o seu”, completou.

Yuri Romão garantiu, porém, que ainda não iniciou nenhuma negociação para SAF. Ele também não quis projetar uma ideia de quantia de investimento.

Reforma da Ilha do Retiro

O Sport pretende iniciar uma reforma na Ilha do Retiro. A ideia do projeto é ser “retrofit”: sem mexer totalmente na estrutura. Para Yuri Romão, a possibilidade deve atrair possíveis investidores da SAF.

“Não há dúvida de que o projeto da Ilha do Retiro, o masterplan do complexo da Ilha do Retiro, possa ser algo que interesse a um investidor da SAF. Não tem a menor dúvida quanto a isso. Quem leu um livro que chama A Liga, que trata da Premier League, pode ver claramente que a mudança do futebol inglês se deu com questões das vendas de transmissões, mas também percepção que os estádios precisavam mudar. No livro tem um termo que chama algumas dependências dos estádios de pocilgas”, disse.

“A Ilha do Retiro é um estádio com 87 anos de construção. Precisa passar por uma reforma. A gente precisa melhorar a experiência do nosso torcedor. A nossa torcida é apaixonada, que vai ao campo, está com o time. Ela quer estar em um espaço condizente com bom tratamento. Há uma generalização de boas circunstâncias que virão e trarão novos benefícios para o clube e para o torcedor, sócio, para quem ama o clube. O investidor vai investir em atletas, equipamentos, mas também vai ter muito retorno quando se tratar de rendas oriundas de jogos”, garantiu.

Momento dos clubes nordestinos

Quatro clubes nordestinos estão garantidos na Série A de 2025: Fortaleza, Bahia, Sport e Ceará. Se o Vitória assegurar a permanência na elite, serão cinco equipes dentre as 20 que disputam a competição. O bom momento, para Yuri Romão, exige um tratamento condizente das federações estaduais.

“Ainda hoje conversei com o presidente da nossa federação e afirmei de forma veemente que a geopolítica esportiva do futebol do Brasil está mudando. Ter 25% de clubes da elite do futebol sendo da região Nordeste é algo a ser exaltado. Não apenas exaltado. É preciso que tanto os clubes como as federações, falo de cearense, pernambucana e baiana, estejam preparadas para esse momento. Não adianta só os clubes se profissionalizarem”, cobrou.

“As federações também precisam estar em linha com este novo momento do futebol brasileiro, em especial ao novo momento da região, do futebol regional. Logo, logo, se Deus quiser, outros clubes de Pernambucano, a exemplo de Náutico, Santa Cruz, Retrô, também alcançarão novos ares, novos patamares. É necessário que haja uma profissionalização, um novo planejamento para as federações, para que acompanhem a ascensão dos clubes. Por isso fiz essa provocação ao presidente da Federação Pernambucana. A geopolítica esportiva está mudando. O Nordeste precisa fazer face a essa expectativa que depositarão”, exigiu.

Projeção para o Sport

Romão não quer que o Sport faça “voos de galinha”, subindo e descendo de divisões. O presidente acredita que o clube deve se estruturar a fim de se manter na elite. Para isso, analisa, é preciso paciência.

“Eu diria que o clube tem se preparado ao longo dos últimos três anos de forma estruturada. Falando de um CT moderno, adequado para receber atletas de primeira linha, a questão administrativa, alicerçada em parâmetros gerenciais que empresas de grande porte exercem. Mais do que isso: o investimento que tem sido feito e permanecerá sendo feito em recursos humanos. É algo que não abro mão, a qualificação do nosso staff”, iniciou.

“Às vezes as pessoas só pensam no atleta, mas esquecem que para ter atleta de bom nível precisa ter corpo de cozinha qualificado para ofertar alimento balanceado, é necessário ter alguém de hotelaria para organizar os dormitórios. Toda essa qualificação do nosso pessoal tem a ver com a expectativa em relação ao que vem para o futuro”, continuou.

“Temos lista de atletas que gostaríamos de ter para contar com eles em 2025 e fazer um campeonato de meio de tabela. Já tenho dito que o ideal para o clube é esse campeonato de meio de tabela e, em 2026, de forma estruturada, já com reservas financeiras, possamos de fato disputar algum campeonato sul-americano, de forma planejada”, sugeriu.

“Criar um ambiente planejado de ascensão, passo a passo, sem fazer aquele voo de galinha, de gastar desmedidamente agora para depois cair novamente. Isso não combina com esse grupo que está à frente do Sport. Fazemos as coisas muito planejadas. É melhor fazer algo de longo prazo do que aquela coisa abrupta de sobe e desce. Isso não é bom para ninguém. Tenho certeza que o torcedor vai entender que esse passo a passo, de forma planejada, é melhor para o clube”, completou.

R$ 500 mil para Lucas Lima jogar

O meia Lucas Lima foi um dos destaques do Sport na temporada. Ele veio emprestado do Santos e com uma cláusula no contrato: para que atuasse contra a equipe paulista, seria necessário que os pernambucanos desembolsassem R$ 500 mil. No primeiro turno, ficou fora. No último domingo, porém, pela última rodada, o presidente pagou para o atleta estar em campo.

Deu resultado: o meio-campista fez os dois gols da vitória por 2 a 1, que garantiu a vaga na elite.

“O que houve para esse final de campeonato foi uma necessidade. Se nós tivéssemos chegado em uma situação melhor do que chegamos, obviamente esses R$ 500 mil seriam economizados. Não tenho a menor dúvida”, disse Romão.

“Eu mesmo disse que o Lucas ia jogar. Acho que foi logo depois do jogo contra a Ponte (37ª rodada). Foi um topdown: o Lucas vai jogar. Ponto. No sentido de: ‘Vou pagar a multa’. Não dei nem a chance de me solicitarem isso”, contou, depois de elogiar o atleta.

“É um extraordinário profissional. Só tenho elogios ao profissional Lucas, não estou nem falando das habilidades. Estou falamos do profissionalismo. Um líder do bem, aquele líder ‘calado’, que todos seguem. Um rapaz alegre, super de boa. Só tenho elogios a ele. Não estou falando realmente do desempenho em campo, porque o desempenho em campo depende muito dos companheiros. Falar do desempenho dele sem falar dos outros não combina, não dá. Não adianta dizer que ele fez um lançamento maravilhoso sem dizer que o outro atleta pegou a bola e fez o gol. O coletivo do Sport favoreceu o futebol do Lucas. Ele sabe e entende isso”, disse.

“O fato de ele ser uma pessoa muito humilde, meiga, ajuda muito para nós, como dirigentes, para a comissão técnica, e ajuda seus companheiros. A alegria de jogar futebol que ele hoje demonstra tem muito a ver com tudo isso, com o ambiente que encontrou, de dirigentes, comissão técnica, funcionários. Gosto de exaltar a questão dos funcionários porque não tem atleta bom se não tiver funcionário bom. Foi necessário pagar a multa e foi dinheiro bem pago”, completou.

O contrato de empréstimo de Lucas Lima com o Sport vai até o fim do ano. Ainda não há uma definição sobre a permanência do jogador.

“A gente conversou com ele de forma breve, não fui nem eu que conversei. Há o interesse por parte dele. Agora que entra de fato uma negociação. Tem empresário, ele, o Santos… Não é algo trivial, não está indo comprar um pacote de feijão. Está negociando um atleta de alto nível. Há interesse das partes, de ele permanecer em Pernambuco, de tê-lo conosco em 2025. Vamos tentar encontrar as variáveis que se encaixam nessa equação para que no fim dê tudo certo”, disse Romão.

Polêmica com Lisca ficou no passado

Há pouco menos de um mês, após a derrota do Sport por 2 a 1 para o América-MG, pela 34ª rodada da Série B, o técnico Lisca, que estava no comando do Coelho, xingou Yuri Romão, chamando de m*** e mandando “tomar no c*”. O mandatário garante que o episódio ficou para trás, mas deu uma “cutucada” no treinador.

“Negócio sem nexo. Eu não havia dito nada, estive no jogo em Minas, não me dirigi ao cidadão e ele saiu com aquelas coisas. Uma pessoa que precisa de fato buscar ajuda, não sei. É dele, acho que ele tem que viver a vida dele. Isso já passou. Esse episódio com o Sport já passou, ele tem que viver a vida dele, buscar fazer bons trabalhos em outras equipes”, afirmou.

“Eu não tenho que estar provando nada para Lisca nem para ninguém. O importante é que o Sport está na Série A em 2025. Temos feito trabalho de reestruturação de um clube gigante como é o Sport. Não tem por que estar polemizando com o treinador. Vida que segue. Ele já é grandinho, já sabe qual caminho é melhor para ele”, finalizou.

Resiliência

O presidente definiu a gestão à frente do Sport com uma palavra: resiliência. Ele justificou a escolha do termo e exaltou os feitos no clube.

“A gente sofreu muito. Pegar o clube em situação como nós encontramos… Digo isso sem fazer alusão em questão política, é apenas uma constatação. Situação pré-falimentar. Caindo de Série A para Série B, em que perde 90% de suas receitas. Conseguir reestruturar, dar uma nova vida ao clube, dar protagonismo, porque ao longo desse ano, principalmente, o clube voltou a ter protagonismo dentro e fora de campo, voltou a ser respeitado pelo ecossistema do futebol, como empresários, presidentes de clubes, dirigentes, CBF”, começou a explicar.

“Isso não foi uma tarefa simples. Foi muito trabalho, dedicação, noites em claro. Foi necessária muita resiliência. Todos os diretores, vice-presidentes e eu próprio somos abnegados. Abdicamos de estarmos em nossos trabalhos, ao lado das famílias, me incluo 100%, porque minha família sofreu muito com isso. Fomos resilientes. Nós tínhamos um propósito, uma vontade inerente com a nossa alma, e conseguimos”, seguiu.

“Mas o acesso por si só não vai encobrir todo trabalho que foi feito na parte administrativa, financeira, de patrimônio, jurídica, algo importantíssimo na trajetória. Foi preciso ter resiliência, força e vontade de superar as questões negativas que encontramos pela frente. Se quer que defina a gestão em uma palavra, o que vem na minha frente é resiliência”, concluiu.