“Quantas entrevistas mais?”, pergunta um esperançoso Pep Guardiola a um dos assessores do Manchester City, prestes a atender com exclusividade à ESPN. Ao ouvir duas, o técnico reage da sua maneira: coça a cabeça, há anos sem os cabelos dos tempos de jogador, e instantaneamente quer iniciar o papo. Nada mais lógico: quanto antes começa um, mais rápido acontece o seguinte.

Não é grosseria. É só como funciona a cabeça de um dos mais marcantes treinadores a pisar em um campo de futebol em todos os tempos. Não importa onde esteja – no centro de treinamento do City, no banco do Etihad Stadium, na sala de entrevista, no refeitório, mesmo em casa –, Guardiola só quer saber de futebol. Uma mente imparável e, muitas vezes, difícil de decifrar.

Falar em Guardiola sem o básico (posse de bola, troca de passes e futebol ofensivo) é impossível. Como também é impossível perceber que, por mais que tenha uma ideia formada, o espanhol se reinventa a cada ano em busca de uma novidade, combustível para a criação de um futebol atraente que encanta há mais de uma década e estará em campo neste sábado (24), quando o City recebe o Ipswich, às 11h (de Brasília), pela Premier League, com transmissão ao vivo no Disney+.

Dá para citar muitas variações ao longo dos anos. No Barcelona, Guardiola foi de Lionel Messi como “falso 9” até o time sem atacantes que amassou o Santos em 2011. Anos depois, transformou Lahm em volante no Bayern de Munique, em uma revolução que foi levada até a seleção da Alemanha. No City, já abdicou de atacantes típicos, trouxe laterais para atuar no meio-campo e formou defesas com quatro zagueiros.

Vaidade? O próprio explica com a simplicidade de quem bola tais ideias.

“É porque senão fico entediado. Fazer a mesma coisa por oito anos me deixaria bastante entediado”, falou o técnico, que depois ampliou a explicação para algo mais tático.

“A outra coisa é que, quando faz alguma coisa e vai bem, alguém observa e busca o antídoto. Se sairmos muito por dentro, se fecham. Se formos pelos lados do campo, se abrem mais. Por fim, também depende dos jogadores que temos. As qualidades que eles têm e como se encontram melhor”.

A capacidade de Guardiola se reinventar ano a ano se reflete diretamente na montagem do elenco daquele que é seu trabalho mais longevo. No Manchester City desde 2016, ele ganhou carta branca para não só impor seu estilo, mas também criar uma filosofia muito evidente na busca por contratações.

Hoje, o City tem ao menos uma dezena de jogadores capazes de atuar em duas ou até três funções. Manuel Akanji, por exemplo, chegou como zagueiro e jogou uma final de Champions League como lateral-direito. Bernardo Silva deixou de ser um ponta driblador e arisco para jogar de volante, falso 9 e até quebrar o galho na lateral, como fez em uma vitória sobre o Arsenal na temporada 2022/23.

“Antes, a obrigação dos defensores era só defender. No Manchester City, eles têm que jogar. Os atacantes também precisam defender, quando antes só tinham que se preocupar com gols”, explica Guardiola, que, para chegar à maneira que seu City jogará, tem um método definido.

“(Para chegar nessas ideias) observo os jogadores, como quero jogar, os movimentos do oponente e assim penso em sequência de passes e de ações. É isso que fazemos”, falou o espanhol, que também tem a mania de assistir apenas uma vez aos jogos do time. “E aí passo as ideias para os jogadores, vejo o que fizemos de mal e de bom”.

Ninguém pode dizer que o método não funciona. Técnico desde 2007, quando assumiu o Barcelona B, Guardiola ostenta incríveis 40 títulos, 18 dos quais aconteceram em sua passagem pela Inglaterra.

Guardiola não sabe o futuro – tem contrato até junho de 2025 e deve definir nos próximos meses se renova ou não –, mas faz uma promessa a quem espera uma grande novidade para a temporada que acaba de iniciar.

“Aguardemos, mas não temos nada de especial [programado]”.

Mas alguém duvida que não?