Beth Carvalho tinha 32 anos quando lançou De pé no chão, um LP de samba com 12 canções, em 1978. A primeira faixa era uma composição de Jorge Aragão, Dida e Neoci Dias: Vou festejar. A música, com interpretação marcante da cantora, entrou na lista das mais tocadas do país. Mais do que isso: invadiu campos de futebol e tomou arquibancadas.

É por conta dessa canção que a sambista é personagem principal de uma matéria em um site de esportes dias antes da decisão da CONMEBOL Libertadores de 2024, que vai ser disputada no próximo sábado (30), às 17h (de Brasília), com transmissão do Disney+. A cantora, botafoguense de coração, se tornou um ícone para os atleticanos. Foi madrinha do samba, do Botafogo e do Atlético-MG. Quando Beth Carvalho morreu, no fim de abril de 2019, os dois finalistas fizeram homenagens.

A relação entre a cantora e o Botafogo era mais antiga e vinha de família, ao lado do pai, mãe e irmã. A sambista frequentava o Maracanã e tinha Garrincha, Nilton Santos e Didi como ídolos. O samba também serviu para mostrar o amor: gravou as faixas “Esse é o Botafogo que eu gosto” e “Ninguém cala esse nosso amor” em homenagem ao clube.

“O jogo mais marcante que vi foi o do gol do Túlio, no primeiro Brasileiro conquistado pelo Botafogo, em 1995, naquela partida contra o Santos, em São Paulo. Na verdade, é o segundo título, porque agora reconheceram o de 1968. Mas na época, para todos os efeitos, era como se fosse o primeiro. E ainda teve a história do gol de impedimento, que reclamam até hoje. O Túlio foi uma maravilha, arrasou. E virou meu ídolo”, disse Beth Carvalho, em 2011, em entrevista ao ‘ge’, em que também relembrou o título carioca de 1989, que encerrou um jejum de 21 anos sem conquistas.

“Esse jogo também foi muito emocionante. Foi no ano em que gravei aquele samba ‘Esse é o Botafogo que eu gosto’. Nessa faixa do disco só tem botafoguense. Os músicos são botafoguenses, o coro também, muitos dos jogadores foram… Maurício, todo mundo. Eu gravei depois do título. Teve um buffet todo de Botafogo. A música pegou, virou um segundo hino”, relembrou, à época.

Os primeiros versos da música deixam claro o alívio pela conquista e a paixão pelo Glorioso: “Esse é o Botafogo que eu conheço. Tanto tempo esperando esse momento, meu Deus. Deixa eu festejar que eu mereço”.

“É tão bonito ver minha gente sorrindo de emoção, o meu Brasil de ponta a ponta chorando, vibrando, saudando o Botafogo campeão”, diz outro trecho.

Vou festejar

A relação com o Atlético-MG veio depois, e aconteceu justamente por conta da música “Vou festejar”. Em 11 de março de 1979, menos de um ano após o lançamento, a torcida do Galo entoou a canção pela primeira vez. Foi na avenida Afonso Pena, em Belo Horizonte, durante a comemoração pelo título estadual do ano anterior.

Os versos que a própria cantora já descreveu como “de vingança”, que poderiam representar, por exemplo, uma desilusão amorosa, viraram um segundo hino para os atleticanos, que passaram a cantar com frequência: “Chora, não vou ligar. Chegou a hora, vais me pagar. Pode chorar, pode chorar. É o teu castigo. Brigou comigo sem ter um porquê. Vou festejar o teu sofrer, o teu penar. Você pagou com traição a quem sempre lhe deu a mão”.

Ao longo das décadas seguintes, a música sempre esteve presente. O principal momento de consolidação da relação entre a sambista e o Galo aconteceu em 2006, quando o clube, depois de ser rebaixado no ano anterior, voltou à elite do Campeonato Brasileiro.

Ela foi convidada para se apresentar diante de um Mineirão lotado, com 75 mil pessoas presentes, na festa do acesso. Chegou de helicóptero e usou a camisa do Atlético-MG no desembarque.

“Foi uma coisa muito espontânea da torcida do Atlético. Nunca poderia imaginar, aquilo foi um fenômeno. O Jorge Aragão, autor do samba, é Flamengo. A letra é de vingança… Foi totalmente espontânea essa história. Nunca imaginei que essa música fosse virar hino de campo. Aí é mais gostoso ainda. Cheguei lá de helicóptero, parecia Papai Noel. Uma loucura. Aquele mundo inteiro cantando ‘Vou festejar'”, relembrou a cantora, certa vez, ao ‘ge’.

Além de sentir de perto o carinho dos torcedores, Beth Carvalho pôde se orgulhar de receber a honraria máxima oferecida pelo Atlético-MG a pessoas e instituições que contribuem com o engrandecimento do clube: o Galo de Prata. A madrinha do samba mostrou, orgulhosa, a homenagem ao Mineirão.