À primeira vista, a abordagem do UFC para comemorar o Dia da Independência do México no próximo fim de semana parece bizarra. O UFC 306, que será realizado no sábado na Esfera, em Las Vegas, tem como atração principal uma luta entre um irlandês-americano de Montana e um nova-iorquino transplantado da República da Geórgia. E, para aumentar o motivo de estranheza, o evento é patrocinado por um braço do governo da Arábia Saudita.

Deixando de lado o branding e os destaques, no entanto, haverá de fato um tema mexicano permeando o segundo ‘Noche UFC’ anual. Antes do evento principal entre o campeão dos pesos galos masculino Sean O’Malley e Merab Dvalishvili, todas as outras nove lutas da noite contarão com um lutador nascido no México ou mexicano-americano. O evento co-principal coloca a campeã peso-mosca feminino Alexa Grasso – de Guadalajara, no estado mexicano de Jalisco – contra a ex-campeã Valentina Shevchenko, para completar uma trilogia que já está cheia de reviravoltas.

Além do clima competitivo, o ambiente da noite no geral promete transportar visual e sonoramente os fãs para o México. Esse será o primeiro evento esportivo na Esfera, o local de entretenimento de última geração que conta com telas e uma experiência imersiva, inaugurado no ano passado, próximo à Las Vegas Strip, aproveitará ao máximo a tecnologia de tirar o fôlego incorporada à enorme estrutura redonda. Durante toda a noite, o UFC usará a tela de LED de 160.000 pés quadrados e o sistema de som com qualidade de show para contar a história das lutas no México.

“Isso é basicamente uma carta de amor para o povo mexicano e sua cultura”, disse o CEO Dana White há algumas semanas no “The Pat McAfee Show”.

Lutas pelo cinturão. Produção de tirar o fôlego. Grandes riscos. MMA de alto nível. Haverá muitas histórias girando em torno da maravilha esférica do UFC 306. Aqui estão algumas para você prestar atenção.

1. A Esfera é a verdadeira estrela do show?

Lutas por títulos é até legal, mas uma noite de MMA na Esfera é algo único. Você pode levar isso ao pé da letra, se levar em conta o que White tem a dizer sobre isso. “Essa será a única vez que faremos um evento aqui”, disse o presidente do UFC, “só porque eu queria fazer isso”.

Então, como será o espetáculo único que ocorrerá no sábado? A julgar pelos visuais alucinantes dos shows que os visitantes já viram até agora nas instalações de R$ 12,8 bilhões, a Esfera oferece aos artistas e outros apresentadores uma tela vazia com possibilidades aparentemente infinitas para uma experiência multimídia imersiva. O UFC não é conhecido pela sutileza, portanto, espere algo grande e ousado e, tomara, não muito exagerado.

A propaganda ao redor da luta está mantendo os detalhes mais específicos em segredo, mas em uma entrevista com Pat McAfee, da ESPN, White disse: “Vamos contar durante o resto da noite a história do combate no México, desde o início dos tempos até o futuro”.

2. “Suga Sean” vai se manter de pé? (É melhor para ele que sim)

Campeonato masculino dos pesos galos: Sean O’Malley (c) vs. Merab Dvalishvili

O’Malley tem uma dúzia de nocautes entre suas 18 vitórias na carreira e seria sensato se ele tentasse conseguir mais um no sábado. Caso contrário, o campeão precisará se manter em pé e manter seu desafiante à distância. Mas isso é mais fácil de falar do que fazer. Dvalishvili é conhecido como “A Máquina”, e seu wrestling se torna inmplacável quando somado a sua energia.

Em 12 lutas no UFC, Dvalishvili tem 79 quedas, o maior número entre os lutadores ativos e 11 atrás do líder histórico, Georges St-Pierre. O recorde estará ao alcance no sábado. Dvalishvili atingiu dois dígitos quatro vezes em uma luta, inclusive em sua única outra luta de cinco rounds – contra o ex-campeão Petr Yan no ano passado, quando conseguiu 11 quedas em 49 tentativas. A propósito, Yan havia lutado contra O’Malley alguns meses antes e conseguiu seis quedas sobre ele.

Será que os chutes, as joelhadas e a mão direita brilhante de O’Malley conseguirão fazer com que Dvalishvili pense duas vezes antes de tentar uma queda atrás da outra? Só de pensar nisso já é exaustivo.

3. O evento co-principal é um remake de “Feitiço do Tempo”?

Campeonato feminino peso mosca: Alexa Grasso (c) vs. Valentina Shevchenko

Grasso vs. Shevchenko. Shevchenko vs. Grasso. E assim por diante.

Há mais de dois anos, esse confronto representa a totalidade da briga pelo título de 56,7 kg, sem nenhuma intrusa à vista. A última vez que uma luta pelo título nessa divisão não colocou essas duas lutadoras frente a frente foi em junho de 2022, quando Taila Santos perdeu para Shevchenko por decisão dividida. Desde então, todos os 11 títulos do UFC mudaram de mãos. E Santos nem está mais no UFC; ela vai disputar um campeonato da temporada da PFL em novembro.

A questão é que Grasso e Shevchenko ainda têm assuntos a resolver. Grasso encerrou o reinado aparentemente inabalável de Shevchenko – sete defesas de título em pouco mais de quatro anos – com uma reviravolta chocante em março de 2023. Shevchenko estava no comando daquela luta até que Grasso contra-atacou um chute giratório no quarto round, tomando o controle das costas e, em um piscar de olhos, aplicando o mata-leão finalizador. Então, na revanche de setembro passado, Grasso manteve o título por uma margem mínima, um empate. Foi um resultado bizarro, mas adequado, após uma luta que alguns tinham certeza de que Shevchenko venceu, enquanto outros viram que Grasso triunfou e outros ainda acharam que foi marcada corretamente como um empate. É hora de resolver isso e seguir em frente.

4. Fazendo um trabalho redobrado no chão

Peso pena: Brian Ortega vs. Diego Lopes

Quando essa luta do card principal terminar, Lopes não estará de folga pelo resto da noite. A luta seguinte terá sua parceira de treino Alexa Grasso, que também é sua aluna de jiu-jitsu. Isso faz de Lopes o cara que ensinou a Grasso o golpe que virou a luta e que, no ano passado, a tornou campeã.

Para que Lopes alcance esse mesmo ápice, ele precisa lidar com Ortega, um ex-desafiante ao título. O domínio de Lopes no tatame será posto à prova nessa luta. Ortega tem as habilidades de luta agarrada para transformar Lopes, o professor, em Lopes, o aluno derrotado.

5. A chance da vida em jogo

Peso galo feminino: Irene Aldana vs. Norma Dumont

Dumont venceu sete de suas últimas oito lutas. As únicas derrotas de Aldana desde 2018 foram contra campeãs – a atual detentora do título Raquel Pennington e as ex-campeãs Amanda Nunes e Holly Holm. Essa luta poderia muito bem ser a luta da candidata número um ao título.

Ou não. Kayla Harrison, a mais recente estrela contratada pelo UFC, luta contra Ketlen Vieira no dia 5 de outubro – na mesma noite em que Pennington defende seu cinturão contra outra ex-campeã, Julianna Peña. Uma vitória de Harrison, que tem mais personalidade e fama como lutadora do que Aldana ou Dumont, provavelmente a colocaria no topo da fila para disputar o cinturão.

Será que um desempenho deslumbrante de Aldana ou Dumont poderia mudar essa dinâmica? Não seria a primeira vez que isso aconteceria no UFC.

6. Ir com tudo para cima

Peso galo masculino: Raul Rosas Jr. vs. Aoriqileng

Raul Rosas Jr. tem 19 anos e já teve o que alguns podem considerar uma carreira completa no MMA. Ele lutou com 10 homens adultos desde que se tornou profissional, pouco depois de seu 17º aniversário. Depois de ganhar um lugar no plantel do UFC por meio da “Dana White’s Contender Series” no final de 2022, Rosas fez quatro lutas no octógono e venceu todas, exceto uma. O que foi mais impressionante foi sua recuperação após a única derrota: Ele obteve duas vitórias, ambas pela via rápida.

O jovem mexicano-americano será testado por Aoriqileng, um veterano com 37 lutas profissionais. O experiente lutador da China iniciou sua carreira profissional em 2005, quando Rosas tinha 11 anos.

7, 8, 9 e 10. Uma contagem de 10 e acabou?

Os pay-per-views do UFC ficaram conhecidos por duas coisas: MMA de alto nível e privação de sono. Com 12 a 14 lutas em uma programação típica de uma noite, um grande card pode durar mais de sete horas no ar, com o evento principal muitas vezes não começando até quase 1h da manhã no fuso horário do leste dos EUA.

Portanto, ver apenas 10 lutas na programação deste fim de semana é revigorante. Talvez essa seja uma mudança temporária, devido a realidade de realizar um show na Esfera. Ou talvez seja uma demonstração de uma tendência dos esportes de acelerar os jogos. O MMA não pode instituir um cronômetro para arremessos como o beisebol, mas os promotores de lutas têm o poder de reduzir a duração tradicional do evento. Os fãs ainda estarão queimando o óleo da meia-noite, já que o card principal tem cinco lutas, como de costume, e começa às 23 horas (horário de Brasília). Mas o início mais tardio do card (20h30) deve deixar os fãs com energia para continuar a noite.